Hoje, mais do que nunca.
Rudolfo Nobre, Senior Strategist na Fullsix
Sabemos que vivemos num novo mundo, quando hoje, mais do que nunca, ouvimos a expressão “hoje, mais do que nunca”.
Hoje, mais do que nunca, ouvimos falar sobre as alterações climáticas, inclusão, diversidade, ou saúde mental. Hoje, mais do que nunca, assistimos a debates acesos sobre as virtudes e vícios de se ser politicamente correto, ao ponto de já não se saber se, algo que inicialmente era positivo, não será, na realidade, apenas hipocrisia. O politicamente correto foi cancelado.
Como foi cancelado o Ricardo Araújo Pereira, a Rita Pereira, o José Milhazes e mais alguém que deverá estar hoje nos trending topics do Twitter. E foram aplaudidos, também.
Não há como negar, estamos no meio de uma guerra. Polarizada entre o preto e o branco, ignorando, pelo meio, toda uma escala de cinza. Ou estão comigo, ou estão contra mim.
E as marcas? Às marcas, o consumidor pós-pandémico que a pandemia despertou (mais ainda) para as causas sociais e ambientais, pede que tomem uma posição. De acordo com o Havas Prosumer Report 2021, 77% dos consumidores preferem marcas com as quais partilham valores. 55% acreditam que as marcas têm um papel mais importante na construção de um futuro melhor do que os próprios Governos. E 85% acredita que estas têm a responsabilidade de fazer a diferença.
É claro que, ao fazê-lo, ao tomarem uma posição, estão a colocar-se no olho do furacão das redes sociais (veja-se o caso do projeto ABCLGBTQIA+ da Fox Life ou mesmo de Miguel Milhão e da Prozis), em risco de serem os próximos a ser cancelados, de perder clientes, embaixadores, talvez mesmo colaboradores ou parceiros de negócio.
O pior é que, muitas vezes, o mesmo acontece se simplesmente ficarem caladas. Sem se posicionarem sobre nada. E, quando o escrutínio aparece, lá vêm os comunicados com pedidos de desculpa e “nós até nos regemos por valor contrários ao que nos acusam” em que ninguém acredita. Tarde demais.
Mas há o reverso da medalha da tomada de posição: ao fazê-lo, apesar dos detratores, estão a ganhar a confiança e lealdade daqueles que partilham a mesma visão do mundo, os mesmos valores (veja-se os casos das campanhas “The Best Men Can Be” da Gillette e “Dream Crazy”, protagonizado por Colin Kaepernick, da Nike). Sejam os consumidores que se enquadram nos tais 77% que prefere marcas com voz social, seja o talento que vai querer trabalhar numa empresa com que se identifica, onde sente que está a fazer a diferença e onde vai querer vestir a camisola. E, óbvio, há também a exposição mediática que se ganha, mais autêntica, mais verdadeira e mais eficaz que qualquer anúncio tradicional.
Mas ao contrário do provérbio inspirado na segunda mulher de Júlio César, às marcas não basta parecer. Têm mesmo de ser o que apregoam: os valores de que fazem bandeira têm de ter reflexo nas políticas internas, na forma como fazem negócio e nos parceiros que escolhem. No impacto que trazem à comunidade e à sociedade em geral, para além dos benefícios que o seu produto ou serviço entrega ao seu consumidor final.
Trata-se, em primeiro lugar, de um olhar para dentro: quais os valores e propósito que definem a marca? Como é que estes se refletem na atividade da empresa?
Em segundo lugar, de um olhar para o exterior: como é que estes valores e propósito se alinham com aqueles que são os interesses e preocupações da sociedade em que se insere? Que compromissos e responsabilidades isso representa junto de todos os seus stakeholders? Como é que pode ter um papel transformador que contribua para a sua visão do mundo?
E, finalmente, trata-se de coragem: de liderar determinada conversa quando esta faz a diferença, talvez antes ainda de outras marcas o fazerem. Quando não é consensual na sociedade, mas reflete com propriedade aquilo em que a marca acredita e pratica. Sem medo do cancelamento (de alguns). Independentemente de quem não concorda.
Eu sou dos 85% que acredita que as marcas têm a responsabilidade de fazer a diferença e é por isso que sou especialmente fã de uma frase atribuída a Rosa Parks, ativista dos direitos civis que se tornou famosa nos anos 50, que resume a minha perspetiva na perfeição: “Stand for something or you will fall for anything”.
Hoje, mais do que nunca.
Rudolfo Nobre
Senior Strategist na Fullsix